sábado, 24 de março de 2012

Solidão em Par


Enquanto o mundo parecia girar você estava ali. Sempre esteve. Criou em mim o pulso firme, o sorriso amargurado, a caminhada sonolenta e demasiadamente cansativa – aparentemente. E você sempre esteve ali. No sutil rumo da caminhada. Nos livros velhos e gastos. Na roupa. No cheiro de mofo e enfim, em tudo. Enquanto eu me debruçava nos livros e voltava aos estudos você estava ali, sentado na minha poltrona tomando café, de pernas cruzadas, resmungando sobre o mundo e quiçá tocando violão - o que você não fazia muito bem.
No dia que surtávamos era tudo diferente. Você me jogava no sofá, eu te mordia o peito e depois dava beijinhos pra passar, você me arranhava e depois voltamos a nossas posições de sempre. Eu na mesa sentado e debruçado sobre os livros e você na poltrona, ou apenas nós dois no parapeito da janela tomando sorvete com pedaços de morango. Sutilmente éramos felizes.
Mordo sutilmente o lábio. Vejo-te passar em frente à TV no meio do meu programa predileto. Você chega tarde e eu demasiadamente cedo. Tomo dois goles de refrigerante, você ama café. Como bolo de chocolate e você prefere devorar a nicotina de seus cigarros. E sobre todas as coisas somos um silêncio abrupto mesmo nas horas mais gritante de nós mesmo. Somos silêncio após silêncio.
O cachorro da vizinha costuma latir sempre que ela sai e você vai lá dar comida por baixo da porta enquanto eu levo meus manuscritos para a editora. É, você fala mais com o cachorro do que comigo, mas não faz mal. Estou bem assim, estou bem aqui sendo um vazio em conjunto. Sendo dois.

Nenhum comentário:

Postar um comentário